A comunidade jurídica recebeu, com surpresa, a edição do Provimento da Corregedoria Geral de Justiça nº 17, de 27 de maio próximo passado (DJE de 05 de junho de 2013), por meio do qual se autorizou e implementou a mediação e a conciliação extrajudicial no Estado de São Paulo.
Nos termos do referido Provimento CGJ nº 17/2013, portanto, ficam os notários e registradores autorizados a prestar serviços de mediação e conciliação que versem sobre direitos patrimoniais disponíveis, em substituição à atuação dos Juízes do Poder Judiciário.
A partir dos “considerandos” da norma em alusão, verifica-se, dentre outros motivos para sua repentina edição, (i) “que é objetivo desta Corregedoria Geral da Justiça consolidar uma política pública permanente de incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios”; (ii) “que, conforme destacado na Resolução nº 125, do Conselho Nacional de Justiça, a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, e que a sua apropriada disciplina em programas já implementados no país tem reduzido a excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças”; e que (iii) “os meios alternativos de solução de conflito, como a mediação e a conciliação, têm alcançado resultados expressivos”.
Além do duvidoso fundamento de validade do Provimento CGJ nº 17/2013 na mencionada Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (que, em nenhuma passagem de seu texto, admite a transferência da função jurisdicional a atores distintos dos próprios Juízes do Poder Judiciário — vide, a propósito, seus artigos 7º, caput e 8º, parágrafo primeiro, que exigem a participação de Juízes na ativa ou aposentados na criação dos Núcleos de Conciliação e a supervisão por Juízes nos Centros de Conciliação), o fato é que a maneira como se deu a edição do Provimento em questão, por si só, demonstra o lamentável distanciamento entre o Judiciário e a sociedade — esta última representada em Juízo ou fora dele, via de regra, pela Advocacia.
Registre-se desde logo que todas as iniciativas que visem aprimorar nosso sobrecarregado sistema de distribuição de justiça são dignas de aplauso, mas, no caso do Provimento CGJ nº 17/2013 em questão, por melhores que sejam seus fins estes definitivamente não justificam seus meios.
Com efeito, é de se lamentar profundamente que uma tomada de posição de impacto e consequências tão amplas e significativas como essas estampadas no Provimento CGJ nº 17/2013 tenha sido adotada sem se ter sequer ouvido e dialogado previamente com a Advocacia ou mesmo com o Ministério Público.
A falta de diálogo é um dos piores males que ocasiona esse distanciamento cômodo, porém perigosíssimo, entre a Magistratura e a sociedade.
A questão não é apenas discutir a validade ou a conveniência dessa medida adotada unilateralmente pela Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo quanto à transferência da função jurisdicional aos notários e registradores e todas as consequências daí advindas, mas sim clamar pelo urgente diálogo e troca de experiências (notadamente de gestão) entre todos os atores envolvidos no sistema de distribuição de justiça: Magistrados, partes, Advocacia e Ministério Público.
Não há mais tempo a perder ou interesses corporativos a defender. Queremos contribuir para a melhora da prestação jurisdicional, mas, para isso, precisamos poder participar do processo decisório a respeito dos rumos do nosso Poder Judiciário que, nada mais representa, do que serviço público.
Marcelo Knopfelmacher é advogado e diretor presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA).
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 8 de julho de 2013