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O rápido encaminhamento do projeto de lei de arbitragem no Congresso Nacional é um exemplo de eficiência numa matéria que foi amplamente discutida e que conseguiu ser aprovada, em tese, em cerca de um ano. Só falta, no momento, o exame pelo Senado, das Emendas da Comissão Especial da Câmara, que são mais de caráter formal. É possível que o projeto possa ser convertido em lei ainda este ano, evidenciando a capacidade de atuação do Legislativo, quando há consenso e vontade política.
O segundo aspecto, e talvez o mais importante, foi a forma de elaboração da lei, cujo anteprojeto foi confiada a uma comissão que reuniu advogados e árbitros das mais variadas tendências e de diferentes Estados e que foi presidida por um magistrado, o ministro Luis Felipe Salomão, com grande experiência na solução dos conflitos e que tem proferido no STJ alguns dos mais importantes votos em matéria de arbitragem. Os trabalhos realizados foram acolhidos, sem modificação, pelo Senador Renan Calheiros e o projeto foi aprovado, em caráter terminativo, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) do Senado. Em seguida, remetido para a Câmara, foi criada uma Comissão Especial que acaba de proferir a sua decisão também final, tendo mantido, as linhas básicas do anteprojeto e da legislação anterior (Lei nº 9.307 de l996).
Como bem salientou o relator, deputado Edinho Araújo, no seu substancial parecer, o novo texto limitou-se a fazer “uma reforma pontual” e preservou “o máximo possível, a integridade da Lei de Arbitragem, reconhecida no Brasil e no mundo, como norma paradigmática”. Foi importante a manutenção da estrutura da legislação anterior, pois havia um receio de uma mudança legislativa substancial que prejudicasse o bom andamento que o instituto teve em nosso país, realizando uma verdadeira revolução na solução extrajudicial dos litígios.Efetivamente, até o fim do século XX, não funcionavam, na prática, essas formas de soluções extrajudiciais, que só eram utilizadas em casos excepcionais, com previsão legislativa específica, quando se tratava de arbitragem com o poder público, ou em algumas questões de direito societário e em contratos internacionais. Assim mesmo, eram poucas as ações de homologação de sentença arbitral estrangeira. Na jurisprudência do STF, ficou conhecida uma ação anulatória de arbitragem, que levou cerca de 30 anos para ser decidida finalmente, o que evidenciava a inviabilidade da utilização do instituto. No próprio STJ, há decisões do início do nosso século que ainda consideravam a arbitragem como instituto pouco usado.
Tais fatos comprovam que a norma jurídica pode mudar os costumes, especialmente quando há novas necessidades e o apoio consensual dos meios jurídicos. Essa mudança teve a sua origem no Projeto Marco Maciel e nos estudos de Selma Lemes, Pedro Batista Martins e Carlos Alberto Carmona que ensejaram a Lei de 1996, agora complementada pela reforma, que consolidou a jurisprudência e a prática, ampliando e democratizando a utilização da arbitragem. E fazendo acertos processuais necessários diante da evolução do instituto. Podemos até dizer que se trata de uma legislação importante para o desenvolvimento do país e que pela qual os vários participantes do trabalho e especialmente o Congresso Nacional merecem a sua gratidão.
Um dos poucos pontos sujeitos à discussão e que ainda pode ser modificado pelo Senado é a inclusão de emenda que sujeita a arbitragem, no caso de ser parte o Poder Público, a uma previsão no edital ou nos contratos, nos termos de regulamento. Em primeiro lugar, trata-se de disposição que contraria a mais recente jurisprudência do STJ que não exige a previsão da arbitragem em instrumento anterior, como se verifica pelo acórdão do Recurso Especial nº 904.813/PR, referente ao caso Companhia Paranaense de Gás Natural (Compagás) contra o Consórcio Carioca Passarelli no qual a douta relatora, ministra Nancy Andrighi esclareceu que “o fato de não haver previsão de arbitragem no edital de licitação não invalida o compromisso arbitral firmado posteriormente”. Em segundo lugar, a referência à necessidade de regulamento, além de desnecessária, como bem salientou, na imprensa, o ministro Salomão, cria um obstáculo para aplicação da determinação legal. Sabemos quanto tempo tem levado a Constituição de 1988 para que as suas disposições sejam adequadamente complementadas por normas legislativas e o mesmo acontece com as leis que dependem de regulamento e que podem ser consideradas como não podendo ser aplicadas enquanto não publicado o mesmo. Acresce que o projeto já estabelece algumas cautelas em relação à arbitragem tratando-se do Poder Público, exigindo a autorização específica do órgão competente. Finalmente, a AGU tem se manifestado, tanto nos seus pronunciamentos, como em vários casos judiciais, a favor da arbitragem. Não há razão para exigir uma previsão no contrato ou no edital, pois a capacidade genérica do Estado lhe permite usar todas as formas de solução de litígios, de acordo com a sua conveniência, respeitadas as normas de direito administrativo.
Arnoldo Wald é advogado, professor de direito civil da UERJ
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Fonte: Valor Econômico

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